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Defensoria ajuda mãe a dar enterro digno a jovem que passou 17 anos sem documentos

Há 17 anos, uma mulher deu à luz a uma criança e sem condições de criar o filho deu para a vizinha. Essa criança nunca foi registrada, mal frequentou a escola e o prontuário do posto de saúde era provisório. Danilo Vidal, como foi batizado, era bastante conhecido no Bom Sucesso, bairro onde cresceu em Fortaleza, mas o Estado não o conheceu. Ele fez parte de um grupo de pessoas invisíveis para os dados oficiais pela ausência de documentação e que ficam privadas dos direitos básicos.

Há dois anos, a mãe adotiva de Danilo morreu e ele estava sob os cuidados da avó de criação. Nos primeiros dias de 2018, Danilo morreu, vítima da violência urbana. Foi quando amigos e familiares se surpreenderam com a ausência de certidão de nascimento. “Resolvemos ajudar com os procedimentos burocráticos de liberação de corpo, porque a avó de criação é uma senhora bastante simples, não é alfabetizada, mas nunca imaginávamos que ele não tinha nenhum documento. A única coisa que a família possuía era o batistério e declarações de prestação de serviços comunitários. No Instituto Médico Legal (IML) nos informaram que a Defensoria Pública poderia nos ajudar, entrei no site para pesquisar e vi várias notícias de parentes que buscaram a Defensoria pra liberar o corpo de entes queridos”, relata Leidiane Silva, vizinha da família adotiva.

Paralelo a isso, os vizinhos localizaram a mãe biológica de Danilo nas redes sociais. Foi quando ela soube da morte do filho e da necessidade de liberar o corpo. “Ela ficou em choque, porque imaginava que o filho tivesse sido ao menos registrado pela família adotiva. Como a mãe de criação dele já havia falecido e a avó não tinha muita instrução, a gente não soube dizer o porquê ele não foi registrado. Mas precisávamos resolver e a mãe verdadeira esteve todos os dias à disposição para fazer isso. Tudo foi muito triste, porque ela nunca imaginou conhecer o filho já morto”, lamenta Leidiane.

Os vizinhos acompanharam a mãe biológica até o hospital onde Danilo nasceu e conseguiram a segunda via da declaração de nascido vivo. Com a documentação, foram ao Núcleo Descentralizado da Defensoria Pública no bairro João XXIII para conseguir um alvará judicial e retirar o corpo do IML. Geralmente, a liberação de um corpo só acontece com a documentação da vítima para alguém que comprove real parentesco.

“Quando atuava no interior era mais frequente fazer ações de registro tardio, mas sempre de alguém ainda vivo. Me surpreendeu a complexidade desta ação e a quantidade de detalhes, porque estamos em uma grande capital. Foi muito marcante saber que a mãe só conheceu o filho depois que ele havia morrido e dar um enterro digno a ele era o seu principal objetivo”, destaca o defensor público Diego Vinhas, que fez o atendimento inicial dos familiares. Neste caso, foi necessária ainda a atuação do defensor público da 13a Vara Cível, Tarcísio Miranda Cordeiro Júnior, para esclarecer o caso à juíza, porque na guia cadavérica, emitida pelo IML, constava o nome da mãe de criação, e não o da mãe biológica.

Ausência de Registro

Todos os dias diversas pessoas recorrem à Defensoria Pública reclamando a ausência do registro de nascimento por inúmeros fatores. São pessoas que passam uma vida inteira sem acesso aos direitos básicos, sem acesso à cidadania, e que só buscam por atendimento desta natureza quando se encontram em uma situação extrema, como por exemplo no falecimento ou na prisão de algum familiar. É importante esclarecer que há maneiras jurídicas simples para providenciar o registro, direito fundamental e pressuposto para a cidadania.

Durante todo o ano de 2017, o Núcleo Central de Atendimento da Defensoria Pública, uma das portas de entradas do órgão,  deu entrada em 107 ações de lavratura de registro civil, na capital. A Defensoria  propicia às pessoas que não possuem o registro, o direito de exercerem com plenitude a cidadania, garantido o acesso ao registro de nascimento, processo que inicia por meio de buscas junto aos cartórios de registro civil de pessoas naturais até a judicialização de ações, quando necessárias. “Às vezes identificamos vários membros de uma mesma família sem o registro de nascimento. É a ausência de cidadania sendo repassada de geração em geração”, lamenta a defensora pública Andréa Rebouças, supervisora do Núcleo Central de Atendimento.

Qualquer pessoa que não possua o registro de nascimento, que não tenha condições de arcar com as despesas de um advogado e que esteja em situação de vulnerabilidade, pode procurar a assistência jurídica da Defensoria Pública para iniciar os encaminhamentos necessários para a lavratura do registro civil. “As pessoas não imaginam as consequências que a ausência de documentos pode acarretar ao longo da vida. Além da dificuldade em acessar todos os serviços públicos, ela ainda fica fora das estatísticas de órgãos oficiais. São dramas pessoais e familiares que acompanhamos diariamente”, finaliza Rebouças.

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Essa matéria faz parte de uma série de reportagens produzidas pela Defensoria Pública do Ceará relatando casos, acompanhados pela instituição, de ausência ou retificação do registro civil.

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